Congresso deve votar vetos de Lula ao licenciamento ambiental poucos dias após COP-30
O Congresso avalia nesta quinta-feira, 27, os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao projeto de lei do Licenciamento Ambiental. Ambientalistas temem que os parlamentares derrubem sanções significativas feitas pelo presidente, como o impedimento para licença autodeclaratória para atividades de potencial médio.
Em agosto, Lula vetou 63 dispositivos do chamado “PL da devastação”, que modifica as regras do licenciamento ambiental no País e abre margem para realização de obras que impactem o meio ambiente sem o devido processo de análise por parte de órgãos ambientais.
Uma análise feita pelo Observatório do Clima classificou como “inegociável” a manutenção de pelo menos 45 vetos feitos por Lula. Os demais foram classificados entre “prioritário” e “importante”. A análise dos vetos ocorre menos de uma semana após a Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-30), que aconteceu em Belém nas últimas semanas. Os vetos seriam analisados antes, mas após um acordo com o governo, a avaliação acabou sendo postergada.
“Logo após a COP-30, quando o mundo observa a capacidade do Brasil de liderar com coerência, manter esses vetos é a única decisão compatível com nossos compromissos climáticos e com um desenvolvimento que respeite os povos, as comunidades e o meio ambiente”, afirma Clarissa Presotti, especialista de Políticas Públicas do WWF-Brasil.
Entre os vetos considerados inegociáveis pelos especialistas está o dispositivo que prevê a concessão de Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para empreendimentos de médio potencial poluidor. A LAC dispensa a análise individual do projeto desde que haja compromisso em aderir a condições pré-estabelecidas. Hoje, o mecanismo é permitido só para obras de pequeno porte, mas o novo licenciamento expandiria a licença para obras maiores.
Especialistas indicam que o uso desse modelo para empreendimentos de médio potencial poluidor poderia autorizar sem análise de impacto ambiental projetos como a barragem da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, que estourou e causou a morte de 272 pessoas.
“A LAC é um apertar de botão e você imprime a licença, não tem entrega de estudo ambiental nenhum pelo empreendedor”, critica Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Um dos pontos mais polêmicos do licenciamento ambiental foi a criação da Licença Ambiental Especial (LAE), proposta pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). O dispositivo permite que projetos considerados estratégicos pelo Conselho de Governo tenham andamento célere. Lula manteve a criação da licença, mas vetou trecho que previa emissão de todos documentos da licença de uma vez, em tramitação monofásica.
“A LAE irá desestruturar todo o processo de licenciamento ambiental por submeter a sistemática de análise a interesses políticos, inclusive com prejuízo aos empreendedores que entraram com pedido de licenciamento antes”, critica análise do OC.
Outro ponto sensível que foi vetado por Lula e que na opinião de especialistas deve ser mantido foram dispositivos que restringiam a consulta aos órgãos responsáveis pela proteção de povos indígenas e comunidades quilombolas para autorizar empreendimentos. O projeto de lei determinava que fossem feitas as consultas somente em caso de terras indígenas homologadas e territórios quilombolas já titulados.
“(O dispositivo vetado) Exclui as terras indígenas em processo de demarcação e as demais que ainda não iniciaram seus processos demarcatórios por motivos diversos, o que ignora 32,6% das Terras Indígenas existentes no país. Ademais, o dispositivo viola entendimento consolidado no STF sobre o conceito de Terras Indígenas, o que, na prática, ensejará o aumento de judicialização”, diz o documento.
O texto aprovado pelos parlamentares também revogou dispositivos previstos na Lei da Mata Atlântica, entre eles o ponto que prevê autorização de órgão federal para desmatamento de vegetação primária e secundária no bioma. Lula vetou essa mudança na lei.
Tensão entre Poderes
O PL do licenciamento ambiental é classificado pelos especialistas como o maior retrocesso ambiental do País nos últimos anos. A manutenção dos vetos do presidente, segundo eles, tornaria o cenário menos preocupante. O contexto, no entanto, é desfavorável para manutenção dos vetos. Nas últimas semanas, a crise entre o governo Lula e o Congresso ganhou novos capítulos, com agravamento da tensão entre os Poderes.
No episódio mais recente, Alcolumbre reprovou a indicação de Jorge Messias para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). O presidente do Senado defendia a indicação de seu aliado e ex-presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, para ocupar a vaga do ex-ministro Luís Roberto Barroso, o que não foi atendido por Lula.
O clima também não é dos melhores com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PI), que declarou ter cortado relações com o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ). Motta tem se queixado de dirigentes do PT irem às redes sociais para criticar a forma como ele conduz os trabalhos na Câmara.
“Os vetos levantados na sanção presidencial garantem um mínimo de segurança jurídica para processos administrativos em curso, evitando uma judicialização em massa dos atos emitidos pelos órgãos licenciadores”, analisa Rárisson Sampaio, assessor político do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

