Escolas põem tecnologia no currículo e na interação com alunos e famílias

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Educar no século 21 significa ir além do currículo tradicional. Atualmente, 92% das crianças e adolescentes brasileiros entre 9 e 17 anos são usuários de internet, o que representa 24,5 milhões de pessoas, segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2025, realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br).

A preocupação chega às escolas, que ampliam o olhar para além dos conteúdos obrigatórios e começam a formar estudantes capazes de navegar com responsabilidade, segurança e senso crítico na internet e nas redes sociais. Da Educação Infantil ao Ensino Médio, cresce o número de iniciativas voltadas a desenvolver competências digitais e midiáticas.

O “Relatório de Monitoramento Global da Educação 2023: Tecnologia na educação: uma ferramenta a serviço de quem?”, da Unesco, aponta as competências digitais como parte de um pacote básico de aprendizagem, reconhecendo que essas habilidades são cada vez mais indispensáveis na vida moderna. Algumas delas são, segundo a publicação, discernimento para avaliar informações de forma crítica, de participar de ambientes colaborativos virtuais, proteger dados pessoais e entender os riscos online, além de produzir conteúdos digitais com responsabilidade, entre outras.

Conhecimento dos alunos é validado

Esse tema é presente no Colégio Magno Mágico de Oz, em São Paulo, onde a gestão integra ao ambiente escolar tudo aquilo que desperta o interesse dos alunos. A diretora Cláudia Tricate explica que, embora crianças e adolescentes sejam muito envolvidos com tecnologia e dominem diversas ferramentas, ainda carregam a ingenuidade própria da idade e, por isso, precisam de apoio.

“Até para que fiquem, no termo que eles mesmos usam, espertos […] Em todas as séries, tanto nas atividades regulares quanto nas extracurriculares, o ponto de partida é entender o interesse deles. Não adianta abordar segurança na web se isso não fizer sentido para eles”, conta.

Na Educação Infantil, as crianças são introduzidas a conceitos básicos de segurança online de maneira lúdica, por meio de jogos, histórias e atividades cooperativas. Já nos anos iniciais do Ensino Fundamental, a escola oferece trilhas formativas mais estruturadas em que os estudantes aprendem sobre algoritmos e fontes confiáveis de informação. Uma das ações, prevê que alunos se transformem em tutores e ajudem colegas a utilizarem ferramentas como o Google for Education, permitindo que eles se tornem usuários críticos da internet.

Para os anos finais e Ensino Médio, o Magno promove ações que incentivam a criatividade e o design digital, por meio do desenvolvimento de apresentações, infográficos e sites para apoiar projetos e exposições.

Segundo a diretora Cláudia, a inteligência artificial também aparece como tema de estudo, tanto na compreensão e discussão sobre o seu funcionamento e no centro de debates éticos, quanto como ferramenta pedagógica para a criação de prompts que criam imagens a partir da leitura de clássicos e complementam atividades de sala de aula.

Prompts x escolhas humanas

A criação de um vídeo por inteligência artificial serviu como ponto de partida para que alunos do Ensino Fundamental do Colégio Vital Brazil investigassem os princípios da educação midiática, como autoria, confiabilidade, linguagem audiovisual e o funcionamento das ferramentas digitais. As crianças puderam refletir o que a IA produz a partir de um prompt simples e o que depende de escolhas humanas.

Durante o ano, os alunos também participaram de atividades desplugadas para desenvolver conceitos de lógica, sequência, padrões e tomada de decisão usando jogos de tabuleiro, setas, cartas e desafios no papel. O objetivo é fazer com que as crianças aprendam o raciocínio por trás da programação sem precisar de telas, desenvolvendo organização de ideias, para depois explorar as plataformas que possibilitam a criação de animações e histórias interativas.

As iniciativas fazem parte do currículo regular de Tecnologia e Inovação dos anos iniciais do Ensino Fundamental do Vital Brazil. A professora Fernanda Lourenço diz que por conta das aulas os alunos já demonstram mais autonomia no uso das tecnologias, uma postura mais responsável nas interações online, mais cuidado ao verificar informações, maior engajamento nas produções digitais e uma compreensão mais clara sobre os riscos e as possibilidades do mundo virtual.

“Além disso, os alunos demonstram evolução significativa no pensamento crítico e na capacidade de interpretar e questionar conteúdos da mídia. As crianças deixam de ser apenas consumidoras de tecnologia e passam a ser produtoras de conteúdo, criando, explorando e dando vida às próprias ideias”, afirma Fernanda.

Mão na massa com ChatGPT e Gemini

Para desmistificar e explicar o funcionamento da IA generativa, o Colégio Dante Alighieri, em São Paulo, realizou uma oficina “mão na massa” com as famílias dos alunos sobre o uso de plataformas como Gemini, ChatGPT e Notebook LMS. Foram simulados alguns prompts que embasaram a discussão sobre limites éticos e vieses.

Valdenice Minatel, Diretora Institucional e de Tecnologia, lembrou que esse tipo de recurso digital, por se assemelhar à interação humana, acaba trazendo um tipo de fascínio sobre os resultados, mas é necessário ter criticidade. “Uma das conclusões que chegamos é de que precisamos fazer um bom prompt para ter um resultado muito bom. Ou seja, é preciso qualificar o repertório de interação, entender exatamente o que preciso e quero, que é algo que trabalhamos muito com os alunos, a construção desse arcabouço de pensamento crítico.”

Outra iniciativa do Dante é a Jornada de Cidadania Digital, um evento anual, que aborda temas como inteligência artificial e cultura digital, envolvendo alunos, professores e famílias em atividades, palestras e projetos formativos.

Cada turma participa de uma atividade diferente adequada à sua faixa etária e a escola incentiva que as discussões sejam continuadas no ambiente familiar dos estudantes. Entre as crianças menores, por exemplo, a escola propôs atividades desplugadas e conversas sobre como se divertir sem utilizar as telas. Já entre as turmas dos estudantes mais velhos foram discutidos temas como segurança, privacidade e responsabilidade nos espaços virtuais.

“Há uma oportunidade incrível de aprendermos com os adolescentes, mas dentro deste contexto onde a segurança são eixos dessa convivência. A escola tem o dever de trazer um conteúdo curado e a ideia é qualificar esse diálogo entre pais e filhos também fora da escola”, acrescenta Valdenice.

Além dessas iniciativas pontuais, o letramento digital e a educação midiática aparecem de forma interdisciplinar no currículo e projetos do colégio, como em produções textuais sobre infocracia e algoritmos e na simulação da Organização das Nações Unidas (ONU) realizada pelos alunos do Ensino Médio, segundo a diretora. “Não tem como ser diferente, se a IA está em todo o lugar, como vamos represar essa discussão em apenas um componente. Seria empobrecê-la.”

Escape room e produção audiovisual

No Colégio Visconde de Porto Seguro, o letramento digital ocorre de forma transversal em toda a jornada do aluno. Neste ano, por exemplo, os alunos do 4º ano, fizeram um escape room com desafios lógicos e enigmas baseados em conceitos como proteção de dados, senhas seguras, sites confiáveis e comportamento respeitoso na internet.

Outro destaque foi a criação de um super-herói da internet segura. Cada personagem tinha um superpoder digital: o de verificar fontes, proteger senhas ou denunciar comportamentos inadequados.

A partir do 7º ano, os projetos ganham complexidade: os alunos produziram campanhas audiovisuais sobre cyberbullying, explorando direitos digitais e ética na produção multimídia e realizando projetos autorais completos com todas as etapas da criação de vídeos.

No 9º ano, o foco se voltou ao futuro do trabalho e à inteligência artificial, com pesquisas sobre impactos tecnológicos, habilidades necessárias e dilemas éticos. Já no Ensino Médio, a escola incentiva projetos avançados com uso de IA, programação e robótica, aplicando o uso ética da IA na criação de soluções para pesquisas interdisciplinares.

Alessandra Buriti, coordenadora de Educação Digital do Colégio Visconde de Porto Seguro, ressalta que a criação de conteúdo digital faz com que os estudantes assumam um posicionamento. “Informamos, inspiramos ou impactamos. Ensinar nossos jovens a fazer isso com ética é preparar cidadãos conscientes.”

Para a coordenadora, o mundo atual conectado, na qual a informação circula com velocidade e, muitas vezes, sem filtro, é necessário que os estudantes se tornem “protagonistas de sua presença digital e sejam capazes de identificar e combater a desinformação”. “Ao integrar tecnologia, ética, empatia e pensamento crítico, construímos muito mais do que habilidades técnicas, formamos valores”, finaliza.

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Estadão

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