Lula assina hoje decreto para limitar taxa a estabelecimentos no vale-alimentação e refeição

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Previsto para ser assinado nesta terça-feira, 12, o decreto de regulamentação do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT) terá, como um dos eixos principais, o limite à taxa de desconto (o chamado MDR, do inglês Merchant Discount Rate). Hoje sem teto estipulado, o porcentual é aplicado aos estabelecimentos sobre cada venda realizada nas operações com vale-refeição (VR) e vale-alimentação (VA), e é uma das principais queixas de supermercados, restaurantes e bares, que alegam que as altas taxas limitam seus lucros.

Pesquisa realizada entre março e abril de 2025 pelo Ipsos-Ipec mostrou que as taxas cobradas pelas empresas tradicionais de benefícios para pagamentos feitos com vale-refeição são 61% maiores do que as praticadas pelas operadoras de cartão de crédito. Em média, a taxa de vale-refeição é de 5,19%, podendo chegar a até 7%. Segundo fontes ouvidas pela Broadcast, o governo deverá definir que a taxa fique sujeita a um teto entre 3,5% e 4%.

Também é esperado o encurtamento do prazo de liquidação – a transferência, pelas operadoras, para os estabelecimentos dos valores pagos pelos cartões VR e VA. Em agosto, falava-se em uma redução desse prazo, hoje de 30 dias, em média – podendo chegar a até 60 dias -, para dois dias. As discussões levaram o prazo para um patamar intermediário, de cerca de 15 dias.

Outra mudança que deverá constar do decreto é o arranjo aberto de pagamento, no qual os cartões de benefícios para alimentação serão aceitos em qualquer estabelecimento, independentemente da bandeira. Hoje, na prática, as quatro grandes tiqueteiras – Ticket, VR, Alelo e Pluxee (antiga Sodexo) – estão em arranjo fechado, ou seja, restritos a uma rede credenciada.

Com o arranjo aberto, haverá interoperabilidade no PAT, pois as grandes bandeiras de cartão (Visa, Master, Elo) já são interoperáveis e têm uma rede credenciada grande. Isso significa a eliminação da exclusividade entre operadoras e empresas.

Por outro lado, a portabilidade, que permitiria ao trabalhador escolher a empresa de benefício, deverá ficar de fora do texto, por razões técnicas. O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho é publicamente contra. Já o Ministério da Fazenda, que se mostra favorável à transferência do saldo pelo empregado, não encontrou uma solução para criar esse instrumento sem a participação do Banco Central. A autoridade monetária já se posicionou contra a possibilidade de assumir essa responsabilidade, por entender que os cartões em questão não constituem meios de pagamento e o governo não conseguiu solucionar a questão.

Quem acompanha as discussões vê ainda a possibilidade de que o decreto traga a criação de um comitê ou um grupo de trabalho (GT) para definir regras adicionais, uma vez que gestões petistas têm o costume de recorrer a esses fóruns. Interlocutores também esperam um prazo de transição para as empresas se adaptarem às mudanças, que pode ser de seis meses a um ano, para a maioria das mudanças.

O decreto está previsto para ser assinado às 16h desta terça-feira, em cerimônia fechada no Palácio do Planalto, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do vice Geraldo Alckmin e, possivelmente, do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e do ministro Luiz Marinho, que deve conceder entrevista logo depois.

Inicialmente, a cerimônia seria aberta a 100 pessoas, mas o cerimonial do Planalto informou que ela foi reduzida em função da logística do presidente, que retornou de Belém na noite desta segunda-feira, 10, após dias de agenda intensa na capital paraense e também na Colômbia, por ocasião da 4ª Cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) e da União Europeia (UE).

A regulamentação do programa é muito aguardada pelas entrantes no segmento, como Caju, Mercado Pago, Nubank, Picpay e iFood, mas conta com a resistência da Associação Brasileira de Empresas de Benefícios ao Trabalhador (ABBT), que representa as tiqueteiras tradicionais.

Também estiveram envolvidas nas discussões com o governo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), que representa estabelecimentos comerciais; a Associação Brasileira de Supermercados (Abras), que reúne as associações estaduais de supermercados; e a Câmara Brasileira de Benefícios ao Trabalhador (CBBT), que reúne empresas de tecnologia já atuantes no mercado (como Caju, Flash e Swile).

O que dizem as interessadas

As entrantes veem a medida como positiva por entender que ela possibilita a abertura do mercado e ajuda na redução das taxas. Segundo elas, a regulamentação deve fazer com que as atuais taxas cobradas pelas empresas tradicionais de benefícios se aproximem das cobradas pelas operadoras de cartão.

“Taxas mais competitivas resultariam na redução dos preços da alimentação do trabalhador, pois muitos restaurantes vão repassar o custo das taxas para os clientes”, avalia Fernando de Paula, vice-presidente da Associação Nacional de Restaurantes (ANR).

Além da diminuição das taxas e custos para os restaurantes – o custo de intermediação -, o aumento da concorrência é visto como benéfico ao trabalhador. Com a interoperabilidade, os restaurantes e supermercados poderão aceitar várias bandeiras a partir de uma única credenciadora, o que resultará no aumento de sua clientela. No entanto, não há garantia de que a redução da pressão nos preços sobre o comerciante seja imediatamente repassada ao consumidor, a exemplo do que acontece com a redução nos preços de combustíveis nas refinarias pela Petrobras, que não é automaticamente refletido nos postos.

Nesta segunda-feira, 10, a ABBT, que representa as tiqueteiras tradicionais, publicou um texto na Folha de S.Paulo em que sustentou que o arranjo fechado garante a fiscalização dos estabelecimentos credenciados e disse que, no arranjo aberto, as bandeiras de cartões de crédito e débito e as empresas de maquininhas têm foco “estritamente financeiro, privilegiando seus próprios negócios, e não o trabalhador”.

“A introdução do ‘arranjo aberto’ prejudica o trabalhador, abre brechas para fraudes e desvia a finalidade social do PAT. Com o controle implantado pelas empresas de arranjo fechado, cerca de 3,5 mil estabelecimentos são descredenciados todos os anos por irregularidades, inclusive pela venda ilegal dos vales”, afirmou a associação.

Contrária às mudanças, a ABBT conseguiu esticar as discussões para que a regulamentação não saísse. “O presidente Lula está prestes a deixar uma marca negativa em sua história, às vésperas de um ano eleitoral, ao colocar em risco a sobrevivência do PAT e a comida de qualidade no prato do trabalhador”, criticou a associação.

PAT

Existente há quase 50 anos, o PAT é um programa de adesão voluntária que prevê incentivos fiscais às empresas em troca da oferta de vale-alimentação e vale-refeição aos empregados. Em outubro de 2024, o Ministério do Trabalho vetou o uso do PAT em benefícios pagos aos empregados sem relação direta com a alimentação, como telemedicina e desconto na academia. Credenciados, bares não podem vender bebidas alcoólicas pelo PAT, sujeitos a fiscalização do Ministério do Trabalho.

Segundo dados da Pasta, o PAT atende atualmente mais de 21,5 milhões de trabalhadores brasileiros, dos quais aproximadamente 86% recebem até cinco salários mínimos. Esses trabalhadores recebem o benefício por meio das cerca de 300 mil empresas beneficiárias inscritas no programa em todo o Brasil. O volume anual de negócios do mercado de benefícios no País está na casa dos R$ 150 bilhões.

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Estadão

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