‘População deve começar a encolher antes de 2042, talvez já na próxima década’, diz demógrafo
A população do Brasil deve começar a diminuir ainda na próxima década — e não mais a partir de 2042, conforme projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A análise é do demógrafo José Eustáquio com base nos dados da pesquisa Estatísticas do Registro Civil, divulgada na manhã desta quarta-feira, 10.
De acordo com os novos dados, o País registrou uma queda recorde da natalidade entre 2023 e 2024 (de 5,8%), a maior desde o início dos anos 1990. Isso indicaria, segundo Eustáquio, que a fecundidade (o número de filhos por mulher) está caindo de forma ainda mais acentuada do que o previsto, acelerando o envelhecimento — e o encolhimento — da população brasileira.
Esse processo acelera também o fim do chamado bônus demográfico, quando a maior parte da população se encontra na faixa etária economicamente ativa e o País teria uma chance maior de crescimento econômico. O envelhecimento e o encolhimento da população pode ter um impacto significativo na economia, na saúde e nas aposentadorias.
Como o senhor explica essa queda tão acentuada do número de nascimentos?
Ainda dependemos da divulgação de outros dados para entender exatamente as razões da queda. Mas podemos levantar hipóteses. Antes de mais nada, a natalidade é diferente da fecundidade. A fecundidade indica o número de filhos por mulher e vem caindo há mais de dez anos. Mas a natalidade, que se refere ao número de nascimentos em relação à população total, depende do número de mulheres em idade fértil, que vinha aumentando. Então, as mulheres estavam tendo menos filhos, mas havia mais mulheres tendo filhos; isso manteve a natalidade mais ou menos estável por um tempo. Agora, por conta do envelhecimento populacional, o número de mulheres no período reprodutivo vem caindo também. Mesmo assim, o aumento foi maior do que o esperado, indicando uma aceleração maior da queda da fecundidade.
Se essa aceleração for confirmada, o que podemos esperar?
Se a queda da fecundidade seguir nesse ritmo, a população vai começar a encolher ainda antes de 2042, talvez já na próxima década.
Alguma outra hipótese para explicar a queda da natalidade?
Sim. Um outro fator a ser levado em conta é a redução da maternidade na adolescência. Embora ela ainda seja alta, teve uma redução significativa nos últimos vinte anos (de 20,8% para 11,3%). Além disso, temos o fato de muitas mulheres estarem adiando a maternidade. Por exemplo, em 2004, cerca de 52% dos nascimentos eram de mães com até 24 anos de idade. Em 2024, essa proporção caiu para 34,6%. Ou seja, as mulheres estão esperando mais tempo para serem mães, o que pode alterar os indicadores momentaneamente.
A situação econômica do País poderia explicar essa redução maior da natalidade?
Sim, poderia. Mas não é o caso. Pelo menos não por causa de uma crise. A economia brasileira cresceu mais neste governo que no anterior, a taxa de desemprego é a menor da série histórica, a pobreza diminuiu, a renda aumentou. Se olhar para todos os indicadores sociais, houve uma melhora generalizada. De qualquer forma, não é necessariamente a pobreza que faz a fecundidade cair. Ao contrário, com aumento da renda, da educação e o maior nível de consumo, a fecundidade tende a cair. Então a hipótese seria que a melhora dos indicadores sociais pode ter acelerado a queda da fecundidade.
Da mesma forma, os números do Registro Civil revelam um aumento significativo do número de mortes anuais. Em 2024 foi registrado um aumento de 4,6% nos óbitos, o que significa, em números absolutos, um acréscimo de 65.811 registros em relação a 2023.
Como o senhor avalia esse dado?
Este aumento era esperado. A única verdade que existe é que todo mundo que nasceu vai morrer. E a probabilidade de morte é maior quanto mais elevada for a sua idade. Como está aumentando a proporção de idosos na população, e a taxa de mortalidade entre eles é maior, esse aumento era esperado.
Essa antecipação do fim do chamado bônus demográfico pode ser prejudicial para o País?
Muita gente acha que sim, que será um grande desafio. Eu prefiro ver como uma oportunidade. Vários países do mundo onde a população já está diminuindo continuam registrando crescimento econômico. A Polônia, por exemplo, no início dos anos 90, tinha uma renda per capita igual a do Brasil. Hoje, com a população bem menor e mais envelhecida, a renda foi multiplicada por três. Outro exemplo é a Tailândia, onde a população também já está em queda e a renda continua subindo. Sem falar na China.

