Quem é o bispo nomeado para conversar com a comunidade LGBT+ no Brasil
O bispo de Jundiaí, dom Arnaldo Carvalheiro Neto, será pelos próximos três anos o responsável por conversar com a comunidade LGBT+ no Brasil. A nomeação foi feita pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em documento datado do dia 17 de outubro.
O bispo, de 58 anos, passa a ser referência no clero para o acompanhamento pastoral dos grupos católicos envolvidos com as comunidades LGBT+. O presidente da Aliança Nacional LGBTI+, Toni Reis, viu a nomeação como “um sopro da atualização da Igreja”.
Dom Arnaldo será o orientador das ações da Rede Nacional de Grupos Católicos que há mais de 15 anos congrega grupos LGBT+ de várias regiões do país. Apesar da nova missão ter dimensão nacional, ele continuará sendo o bispo diocesano de Jundiaí.
“A CNBB me confiou um papel de articulação, assim todos os grupos podem entrar em contato e partilhar suas necessidades, pedir orientação e dialogar com a Igreja local”, diz ele.
Dom Arnaldo é paulistano e cursou filosofia na Faculdade Salesiana de Filosofia, Ciências e Letras no Centro Universitário Salesiano de São Paulo (Unisal). Ele prosseguiu os estudos para formação sacerdotal em Lorena, concluindo a preparação no Instituto Teológico Rainha dos Apóstolos, em Marília, ambas no interior paulista.
O bispo também possui formação em direção espiritual e capelania hospitalar. Ele estudou em Chicago, nos Estados Unidos, e em Dublin, na Irlanda. Dom Arnaldo foi ordenado padre em 1997 e nomeado bispo pelo papa Francisco em 2016. Como padre, atuou em diversas paróquias do interior paulista, entre elas Araçatuba, Birigui e Itapeva.
Conforme a CNBB, a nomeação do bispo de Jundiaí como interlocutor da comunidade LGBT+ foi feita a partir do discernimento da presidência e das comissões do clero que identificaram essa necessidade. Conforme dom Arnaldo, o convite foi feito pessoalmente pelo secretário-geral da CNBB, dom Ricardo Hoepers.
Segundo a CNBB, apesar de ser referência nacional para estes grupos católicos, a função de dom Arnaldo não substitui a autoridade dos bispos em suas respectivas dioceses. Seu papel será de mediação e promoção do diálogo entre as unidades, incentivando ações de caridade em grupos, nas igrejas particulares ou núcleos envolvidos com a comunidade LGBT+.
Dom Arnaldo acredita que pode ajudar os fiéis dessas comunidades a estarem próximos de Deus, “em um espaço de escuta, discernimento e de comunhão, em que serão acompanhados sem ideologias ou reducionismos”.
Recentemente, o papa Leão XIV reafirmou a doutrina tradicional da Igreja em relação à família, mas também deixou claro que a comunidade LGBT+ é bem vinda à Igreja, como havia feito o papa Francisco.
“Acolher com misericórdia não significa aprovar tudo, relativizar a verdade ou renunciar ao discernimento, mas, sim, e especialmente olhar cada pessoa com a mesma dignidade que Cristo reconhece nela”, diz o bispo em texto divulgado pela diocese.
Em sua rede social, a Rede Nacional de Grupos Católicos LGBTQIA+ manifestou louvor pelos sinais de comunhão que iluminam o caminho da Igreja no Brasil. “A nomeação foi recebida com profunda gratidão, reconhecendo que ela é fruto da caminhada fiel, madura e comprometida de todas e todos nós, cristãos leigos e leigas que têm testemunhado o Evangelho da dignidade, da misericórdia e da acolhida em nossas comunidades.”
“Um sopro de atualização da Igreja”
Na diocese de Jundiaí, a pastoral LGBTQIAPN+ formada em 2021 realiza encontros mensais, que incluem momentos de oração, escuta, conversas, leituras e formação doutrinária e espiritual. “Os grupos LGBT são grupos reais, de carne, osso, além de fé, dúvidas lutas e esperança. São gays, lésbicas, bissexuais, etc, e muitos foram batizados e criados na Igreja Católica. E formaram grupos que compõem a Rede Nacional. O papel do bispo é profundamente eclesial, de acompanhar, acolher, escutar, orientar, rezar junto e garantir a comunhão com a Igreja”, diz Samuel Vidilli, gestor de comunicação da diocese.
Reis, da Aliança Nacional, lembra que a entidade lançou um manual de cristianismo e LGBT+ que auxilia na compreensão das doutrinas da Igreja e da inserção das comunidades no mundo cristão. “Como gay, católico, apostólico romano, casado com meu esposo há 33 anos, pai do Felipe, da Alice e do Alysson, os três batizados na Igreja Católica – na época do batismo recebemos uma carta muito linda do Vaticano – vi essa nomeação como um sopro de atualização da Igreja.”
Ele recorda que a Santa Inquisição matava pessoas “como nós” na fogueira. “Agora, nomeando um bispo para nos acompanhar, é uma evolução enorme. A gente acredita que algo está mudando e isso é muito bacana. Nós passamos por essa história pecaminosa na Idade Média, depois fomos criminalizados e até tratados como doentes. Esses três estigmas persistem, mas essa nomeação é uma sopro de esperança de que a gene pode ter instituições que acolham e respeitem a diversidade humana. Pode ser um pequeno passo para a CNBB, mas um grande passo para nossa comunidade”, diz.

