Mineira que teria vivido 60 anos sem comer ou dormir vira tema de estudo científico da UFJF
Floripes Dornellas de Jesus, a “Lola”, morreu em 1999 e é investigada por suposto caso de “inédia eucarística”; pesquisa busca entender se o fenômeno tem base médica, psicológica ou espiritual

A história de Floripes Dornellas de Jesus, conhecida como “Lola”, voltou ao debate público após se tornar tema de uma pesquisa científica conduzida pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Nascida em 1913 em Mercês (MG) e falecida em 1999, Lola ficou conhecida por relatos de que teria passado mais de 60 anos sem comer, beber ou dormir, vivendo apenas da comunhão diária — fenômeno descrito por devotos como “inédia eucarística”.
A mudança radical em seu corpo e comportamento começou após uma queda de jabuticabeira na juventude, que lhe causou fratura na coluna e paraplegia. Com o tempo, segundo familiares e moradores de Rio Pomba (MG), onde viveu por décadas, seu apetite, sede e necessidade de sono teriam diminuído de forma progressiva até praticamente desaparecerem. Médicos que acompanharam parte de sua trajetória relataram que, apesar da imobilidade, ela não desenvolvia escaras típicas de longos períodos acamada, algo que intriga pesquisadores até hoje.
O caso passou a ser investigado oficialmente pelo Núcleo de Pesquisa em Espiritualidade e Saúde (Nupes) da UFJF, coordenado pelo psiquiatra Alexander Moreira-Almeida. A equipe reúne especialistas em geriatria, gastroenterologia e saúde espiritual para avaliar três hipóteses principais:
distúrbios alimentares ou psicossomáticos severos;
falhas de monitoramento ou interpretações equivocadas ao longo dos anos;
um possível fenômeno espiritual sem explicação científica convencional.
Os pesquisadores afirmam adotar um “ceticismo saudável”: investigar sem pré-julgamentos, mas também sem assumir a veracidade dos relatos sem evidências robustas.
A análise, no entanto, enfrenta limitações significativas. Como Lola morreu em 1999, não é possível realizar exames contemporâneos ou monitoramento direto. A equipe trabalha com entrevistas, documentos históricos, prontuários, registros de visitas e depoimentos de médicos que a acompanharam em vida. Um deles, o geriatra Cláudio Bomtempo, afirmou que a privação de comida e água não aparentava lhe causar danos graves além da fragilidade natural da idade.
O interesse pelo caso vai além da ciência. Na Igreja Católica, Lola é reconhecida como Serva de Deus, primeiro passo do processo rumo à canonização. Para o padre postulador da causa, Rodney Francisco Reis da Silva, a pesquisa científica pode reforçar a credibilidade dos relatos e do testemunho de fé atribuído à mineira.
Enquanto isso, o local onde Lola viveu em Rio Pomba segue recebendo devotos e visitantes curiosos sobre sua história. Para especialistas, o caso abre espaço para diálogo entre ciência, espiritualidade e cultura popular, áreas que raramente se cruzam de maneira tão direta.
A investigação da UFJF já foi aprovada pelo comitê de ética e encontra-se na fase de coleta intensiva de dados. A análise de contradições e lacunas nos registros será fundamental para determinar até onde os relatos se aproximam — ou não — de explicações científicas.
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