O escândalo da “pílula de farinha”: erro em fábrica levou centenas de mulheres à gravidez indesejada no Brasil
Em 1998, um erro de produção fez com que lotes do anticoncepcional Microvlar, da Schering do Brasil, fossem distribuídos sem o princípio ativo hormonal. Mulheres em todo o país engravidaram apesar do uso regular da pílula, que continha apenas amido e farinha. O caso se tornou um marco na história da vigilância sanitária e impulsionou mudanças nas regras de controle de medicamentos no Brasil

Era 1998 quando clínicas e consultórios brasileiros começaram a registrar um fenômeno incomum: dezenas de mulheres, de diferentes estados, engravidavam apesar de afirmarem seguir corretamente o uso de anticoncepcionais. Os relatos se acumulavam e tinham um ponto em comum — o mesmo medicamento, fabricado por um único laboratório. Meses depois, a verdade veio à tona: a “pílula de farinha” havia entrado em circulação, resultado de uma falha grave na linha de produção do anticoncepcional Microvlar, da Schering do Brasil (atual Bayer).
Durante testes de embalagem, lotes que deveriam ter sido descartados — e que continham apenas amido e excipientes, sem o hormônio ativo — acabaram sendo embalados e distribuídos para farmácias. O erro só foi descoberto quando centenas de mulheres relataram gestações inesperadas.
A imprensa batizou o episódio de “escândalo da pílula de farinha”, que rapidamente ganhou repercussão nacional. Em 1999, uma auditoria federal confirmou que parte das pílulas vendidas não continha o princípio ativo anticoncepcional, e outras apresentavam dosagens abaixo do mínimo necessário.
Na época, a Anvisa ainda não existia — sua criação viria apenas no ano seguinte. A investigação coube ao Ministério da Saúde e a órgãos estaduais, e revelou falhas graves de controle interno e rastreabilidade na indústria farmacêutica. O caso levou à criação de normas mais rígidas de fiscalização e controle de qualidade de medicamentos no país.
Centenas de mulheres entraram com ações judiciais contra o laboratório, alegando danos físicos, psicológicos e morais. Em muitos casos, as indenizações chegaram a mais de R$ 100 mil (em valores da época). Para várias famílias, as consequências foram devastadoras: planos interrompidos, separações e forte abalo emocional.
“O corpo não me traiu, o remédio é que me enganou”, declarou uma das vítimas em entrevista anos depois.
Mais de duas décadas depois, o episódio ainda é lembrado como um marco na história da saúde pública e da ética farmacêutica no Brasil. A “pílula de farinha” deixou uma lição duradoura: a confiança em medicamentos depende não só da ciência, mas também de responsabilidade, controle e transparência.
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